quarta-feira, 2 de março de 2011

SÓ ACONTECE COMIGO

À que saiu de casa toda arrumada e levou banho de poça d'água. Ao que levou um pé na bunda às vésperas do casamento. Ao que acabou de receber e teve todo o salário roubado. À que se apaixonou tarde demais por alguém que já foi apaixonado por ela. À que engravidou na primeira transa. Ao que quebrou o dente da frente no dia em que ia dar uma palestra. À que ficou menstruada no dia em que resolveu sair de roupa branca. Ao que desistiu de investir em um negócio e depois acompanhou o seu sucesso. Ao que foi demitido no dia do aniversário. Ao que foi confundindo com um terrorista ao tentar entrar nos Estados Unidos. À que teve as malas extraviadas durante a viagem. À que desmaiou durante a primeira visita à casa do novo namorado. Ao que ficou doente justamente quando conseguiu tirar férias.

A todos estes só parece restar uma curiosa alternativa: a de se consolar se julgando importante demais e proferir a famigerada pérola: só acontece comigo! "Só acontece comigo" tem cara de um ato de desespero mas é, na verdade, um ato de egocentrismo. É como se, se apegando à ideia de ser exclusivo em algum nível para o universo, a pessoa se sentisse menos desgraçada. Mas, olha, sem querer ser desagradável nem nada (não é mesmo essa minha intenção. Tanto que eu iria postar essa crônica semana que vem, mas decidi me adiantar pra não estragar o carnaval de ninguém), gostaria de partilhar uma descoberta feita às duras penas. Chupa essa manga, meu caro: não, não acontece só com você!

Você pode, sim, ser um azarão, frequentemente contemplado pelas ironias da vida. Mas isso não significa que você seja especial para o mundo, a ponto de todas as forças do universo conspirarem para que algo aconteça única e exclusivamente na sua vida. Já parou para pensar há quanto tempo esse planetinha está orbitando por aí? E já parou para pensar em quantas pessoas já passaram por aqui desde então? Quer dizer, cogitar a ideia de que qualquer coisa, por mais absurda que seja, tenha acontecido só com você é se achar importante demais.

Mas sabe qual é a parte boa? Sim, tem uma parte boa (não precisa ficar triste pensando "ah, acabei de descobrir que não sou importante, por causa de uma crônica boba. Só acontece comigo..."). A parte boa é que, não sendo único, exclusivo e especial, significa que você não está sozinho! Você é só um grão de areia mas, olha aí, com outros milhares de grãos de areia em volta de você. Saber que outras pessoas passaram e passam por situações semelhantes às nossas e continuam por aí, vivendo e até felizes, é reconfortante. Ter em quem se espelhar para seguir em frente é um alento muito mais interessante do que viver acreditando que, enquanto a gente dorme, as estrelas conspiram contra nós.

O mundo não está te perseguindo! Pare de correr e dê um delicioso abraço nele.


Foto: www.sxc.hu
Fernanda Pinho
Fonte: Crônica do Dia

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